A Origem da Tragédia - Cap. 16: Capítulo 16 Pág. 91 / 164

A palavra para tal nova e inaudita apreciação elevada do saber e do conhecimento proferiu Sócrates, quando ele viu ser o único que confessava saber nada; enquanto que, durante sua excursão crítica através de Atenas, indo ter com os maiores estadistas, oradores, poetas e artistas encontrou em todos a presunção da sabedoria. Foi com admiração que ele reconheceu que todas aquelas celebridades não tinham conhecimentos justos e seguros nem sobre seu próprio ofício, praticando este somente através do instinto. “Somente através do instinto”: com esta expressão atingimos o coração e o ponto nevrálgico da tendência socrática. Com ela condena o socratismo tanto a arte existente quanto a ética existente; para onde quer que dirija os seus olhares perscrutadores, reconhece ele a falta de compreensão e o poder de imaginação, deduzindo desta falta o erro interno e a desnecessidade do existente. Partindo deste ponto crê Sócrates dever corrigir a existência: ele só, entra, como precursor de uma cultura, arte e moral totalmente diferentes, com ar de desprezo e superioridade, num mundo cuja ponta procuraríamos atingir, e que constituiria para nós uma felicidade grande.

É esta a dúvida horrível que nos sobrevém, frente a Sócrates, o que sempre de novo nos instiga a reconhecer o espírito e a intenção desta figura mais questionável da antiguidade. Quem é que se permite, como único, negar o ser grego que, como Homero, Píndaro e Ésquilo; como Fídias; como Péricles; como Pítias e Dionísio; como o abismo mais profundo e a cultura mais elevada, está certo de nossa veneração e admiração? Qual a força demoníaca que ousa arremessar à poeira a bebida mágica?





Os capítulos deste livro