Crepúsculo dos Ídolos - Cap. 10: Capítulo 10 Pág. 70 / 106

Para algo desejável da vida? - A arte é o maior estimulante para a vida: como se poderia entendê-la como sem finalidade, como sem meta, como l'art pour l'art? Uma pergunta ressurge: a arte faz com que se manifeste também algo feio, duro, discutível da vida - ela não parece com isto dirimir a paixão pela vida? - E de fato houve filósofos que lhe emprestaram este sentido: "apartar-se da vontade", ensinava Schopenhauer enquanto intuito total da arte, "estar afinado com a resignação" honrava ele enquanto a grande utilidade da tragédia. - Mas isto - já dei a entender - é uma ótica de pessimista e um "mau-olhado": precisa-se apelar para os próprios artistas. O que é que o artista trágico comunica de si? Não é exatamente um estado sem temor frente ao temível e problemático, que ele indica? - Esse estado mesmo é algo desejável; quem o conhece o louva com os louvores mais elevados. Ele o comunica, ele precisa comunicá-lo, pressuposto que é um artista, um gênio da comunicação. A valentia e a liberdade do sentimento frente a um inimigo poderoso, frente a uma sublime adversidade, frente a um problema que desperta horror - esse estado triunfal é aquele que o artista seleciona, que ele glorifica. Diante da tragédia, o que há de belicoso em nossa alma festeja suas Saturnais; quem procura por sofrimento, o homem heróico, exalta com a tragédia sua existência - a ele apenas, o artista trágico oferta o cálice desta dulcíssima crueldade. –

25.

Contentar-se com os homens, manter a casa aberta com seu coração, isto é liberal, mas é meramente liberal. Conhece-se os corações que são aptos à nobre hospitalidade, junto às muitas janelas cobertas e aos postigos cerrados: seus melhores espaços mantêm-se vazios. Por que afinal? - Porque eles esperam por hóspedes, com os quais a gente não "se contenta"...





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