— Dai-me esse bordão, que preciso dele.
— Com a melhor vontade — respondeu o velho — aqui está, senhor.
E pôs-lho na mão.
Pegou-lhe Sancho e, dando-o ao outro velho, continuou:
— Ide com Deus, que já estais pago.
— Eu, senhor! — respondeu o velho — pois esta cana vale dez escudos de ouro?
— Vale, sim, ou sou eu o maior asno do mundo; e agora se verá se tenho ou não cachimônia para governar um reino inteiro.
Mandou que ali diante de todos se quebrasse e abrisse a cana. Fez-se assim, e dentro dela acharam dez escudos em ouro. Ficaram todos admirados e tiveram o seu governador por um novo Salomão.
Perguntaram-lhe como é que coligiu que estavam na cana aqueles dez escudos; e ele respondeu que tendo visto o velho dar o bordão ao seu contrário, enquanto fazia o juramento de que lhos dera real e verdadeiramente, e tornar-lho a pedir logo que acabou de jurar, acudiu-lhe à imaginação que estava dentro dele a paga do que se pedia. Donde se pode concluir que os que governam, ainda que sejam uns tolos, às vezes encaminha-os Deus em seus juízos; tanto mais que ele ouvira contar um caso assim ao cura da sua terra, e tinha tanta memória que, se não se esquecesse de tudo de quanto se queria lembrar, não haveria memória assim em toda a ilha. Finalmente, um dos velhos corrido e o outro pago, foram-se ambos, e os presentes ficaram admirados, e o que escrevia as palavras, feitos e gestos de Sancho, não sabia se o havia de classificar como tolo se como discreto.