A Escrava Isaura - Cap. 14: Capítulo 14 Pág. 113 / 185

É que a pobre Isaura, cheia de sustos e desconfianças, durante uma pausa tinha notado os movimentos do infame Martinho, quando encostado ao umbral da saleta com um papel na mão, parecia examiná-la com a mais minuciosa atenção. Aquela vista produziu nela o efeito de um raio; não duvidou mais que estava descoberta, e irremissivelmente perdida para sempre. Súbita vertigem lhe escureceu os olhos, pareceu-lhe que o chão lhe faltava debaixo dos pés, e que ia sendo tragada pelas fauces de um abismo imensurável. Para não cair foi-lhe preciso agarrar-se fortemente com ambas as mãos ao braço de Álvaro arrimando-se em seu peito.

- Que tem, minha senhora? - perguntara-lhe este, assustado. - Está incomodada?...

- Algum tanto, - respondeu Elvira com voz desfalecida e arquejante, e reanimando-se pouco a pouco. - Foi uma dor aguda... uma pontada deste lado... mas vai passando... não estou acostumada com este aperto... o remoinhar da dança me fez mal.

- Mas há de acostumar-se em pouco tempo - replicou-lhe Álvaro, segurando-lhe uma das mãos e sustendo-a com um braço pela cintura. - A senhora nasceu para brilhar nos salões... mas, se quer retirar-se...

- Não, senhor; continuemos; já agora estamos na final...

Com estas respostas evasivas Álvaro tranquilizou-se, e em razão dos movimentos rápidos da quadrilha na marca final, que imediatamente seguiu-se, não pôde notar a extrema palidez e profundo transtorno das feições de Elvira. A infeliz já não dançava, arrastava-se automaticamente pela sala; seu espírito não estava ali, não ouvia nem via outra coisa senão a figura repugnante do Martinho, postada como esfinge ameaçadora junto à porta da saleta, para a qual ela volvia de quando em quando olhos cheios de ansiedade e pavor.





Os capítulos deste livro