A Origem da Tragédia - Cap. 14: Capítulo 14 Pág. 80 / 164

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“Público”, porém, não passa de uma palavra e não é, de modo algum, uma grandeza homogênea e permanente em si. De onde viria a obrigação do artista de se acomodar a uma força, que somente encontra a sua força no número? E se, de acordo com suas aptidões e seus intentos, ele se sentir superior a todo e qualquer espectador, como poderia sentir, diante da expressão comum de todas essas capacidades a ele subordinada, mais respeito do que diante do espectador isolado, o relativamente mais apto? Em verdade não existiu artista grego que tratasse durante uma longa vida, com maior ousadia e confiança própria, o seu público de que precisamente Eurípides; ele que, mesmo quando a multidão se arrojava a seus pés, batia, com sublime obstinação, publicamente no rosto de sua própria tendência, tendência esta, com que venceu a multidão. Se este gênio tivesse tido o menor respeito pelo pandemônio do público, ele teria sucumbido sob os rudes golpes de seus fracassos, muito antes de ter atingido ao meio de sua carreira. Vemos, fazendo estas considerações, que a nossa expressão, segundo a qual Eurípides levou o espectador ao palco, a fim de capacitá-lo a julgar, somente foi provisória, e que devemos procurar um entendimento mais profundo em sua tendência. Sabe-se, no entanto, como, pelo contrário se encontravam Ésquilo e Sófocles durante sua existência, e mesmo depois dela, em posse do favor público e que, portanto, não se pode falar de um mal-entendido entre obra de arte e público, tendo em vista estes precursores de Eurípides. O que foi que afastou o artista, tão ricamente dotado e impelido ao labor contínuo, do caminho iluminado pelo sol dos maiores artistas coberto pelo céu desanuviado da graça popular? Que consideração estranha para com o espectador o guiou para junto do mesmo?





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