A Mulher de Trinta Anos - Cap. 3: Aos trinta anos Pág. 116 / 205

Pascal disse: “Duvidar de Deus é crer na sua existência”. Do mesmo modo, a mulher só se insurge quando se sente vencida. No dia em que a marquesa confessou a si mesma que era amada, teve de flutuar entre mil sentimentos contrários. As superstições da experiência falaram na sua linguagem. Seria feliz? Poderia encontrar a felicidade fora das leis de que a sociedade faz, com ou sem razão, a sua moral? Até ali, só encontrara amargura na vida. Haveria um desenlace feliz, possível aos selos que unem dois entes separados por conveniências sociais? Mas também jamais se pagará demasiado caro a felicidade? Talvez essa felicidade tão ardentemente desejada, e que é tão natural, fora encontrada por fim! A curiosidade advoga sempre a causa dos amantes. Em meio a essa secreta discussão, chegou Carlos de Vandenesse. A sua presença afugentou o fantasma metafísico da razão. Se tais são as sucessivas transformações pelas quais passa um sentimento, mesmo rápido, num rapaz e numa mulher de trinta anos, chega um momento em que as cores se fundem, em que os raciocínios se resumem num só, numa última reflexão que se confunde num desejo e que o alimenta. Quanto maior for a resistência, mais poderosa será a voz do amor. Aqui termina, portanto, esta lição ou, antes, este estudo em escorço, se é permitido tomar de empréstimo à pintura uma das suas expressões mais pitorescas; porque esta história explica os perigos e a mecânica do amor mais que os pinta. Desde esse momento, cada dia ajuntou mais poesia àquele sentimento, revestindo-o das graças da mocidade, reavivando-o, dando-lhe todas as seduções, todos os encantos da vida. Carlos encontrou a senhora d’Aiglemont pensativa; e quando lhe disse, nesse insinuante tom que as suaves magias do coração tornaram persuasivo: - Que tem? -, a marquesa não respondeu.





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