A Mulher de Trinta Anos - Cap. 4: O dedo de Deus Pág. 128 / 205

em silêncio, lançou ao irmão um desse olhares profundos que me pareciam inexplicáveis e contemplou primeiro com sinistra atenção o talude no cimo do qual se achava o menino, depois o Bièvre, a ponte, a paisagem e a minha pessoa.

Receei ser visto pelo feliz par, cujo colóquio teria sem dúvida perturbado; retirei-me de mansinho e fui me refugiar por trás de uma sebe, cuja folhagem me ocultava completamente a todos os olhares. Sentei-me tranqüilamente no talude, contemplando silencioso ora as belezas mutantes do lugar onde me achava, ora a pequena selvagem que ainda podia avistar pelos interstícios da folhagem e do sabugueiro sobre o qual minha cabeça repousava, quase ao nível do chão. Não me vendo mais, Helena pareceu inquieta; seus olhos negros procuravam-me na distância, por detrás das árvores, com uma curiosidade indefinível. Que seria eu para ela? Nesse momento, o riso inocente de Carlos ressoou no silêncio como o canto de um passarinho. O belo rapaz, louro como ele, fazia-o saltar nos braços e beijava-o, prodigalizando-lhe esses nomes sem nexo que inventamos carinhosamente para as crianças. A mãe sorria, vendo-os, e de vez em quando dizia, sem dúvida, em voz baixa, palavras que lhe saíam do coração; porque seu companheiro parava de brincar com a criancinha e fitava-a com amor e idolatria. Suas vozes, confundindo-se com a da criança, tinham um não sei quê de acariciador. Eram encantadores todos os três. Essa cena deliciosa, no meio de tão magnífica paisagem, tinha uma suavidade incrível. Uma mulher formosa, risonha, um filho do amor, um homem em plena mocidade, um céu puro, enfim, todas as harmonias da natureza se uniam para alegrar a alma. Surpreendi- me a sorrir como se essa felicidade fosse minha. Deram nove horas. O rapaz, depois de ter beijado ternamente sua companheira, que se tornara séria e quase triste , voltou para seu tílburi, que avançava devagar, guiado por um velho criado.





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