A Mulher de Trinta Anos - Cap. 2: Sofrimentos desconhecidos Pág. 94 / 205

- Está perdida, pobre senhora - disse o padre, gravemente e muito comovido. - Voltará para o mundo e enganá-lo-á; procurará, encontrará nele o que considera uma compensação aos seus pesares; depois há de sofrer um dia o tormento dos seus prazeres...

- Eu! - exclamou a marquesa. - Entregar ao primeiro devasso que souber representar a comédia de uma paixão as derradeiras, as mais preciosas riquezas do meu coração, e corromper minha vida por um momento de duvidoso prazer? Não, minh’alma consumir-se-á numa chama pura. Senhor, todos os homens têm a percepção do seu sexo; porém aquele que lhe possui a alma e que pode assim satisfazer todas as exigências da nossa natureza, cuja melodiosa harmonia só vibra sob a pressão do sentimento, esse não se encontra duas vezes em nossa existência. É horrível o meu futuro, bem o sei: a mulher nada é sem o amor, a beleza nada é sem o prazer; mas a sociedade não reprovaria a minha ventura, caso ela ainda se me apresentasse? Devo à minha filha uma mãe honrada. Ah!, sinto-me presa num círculo de ferro, de onde não poderei sair sem ignomínia. deveres da família, cumpridos sem recompensa, aborrecer-me-ão; amaldiçoarei a vida; mas minha filha terá ao menos aparentemente uma boa mãe. Dar-lhe-ei tesouros de virtude, como compensação aos tesouros de afeição que não pude dedicar-lhe. Nem se quer desejo viver para gozar o prazer que causa às mães a felicidade dos filhos. Já não creio na felicidade. Qual será a sorte de Helena? A minha, sem dúvida. Que meios têm as mães para assegurarem às filhas que o homem a que se entregam será um esposo segundo o seu coração? Cobrem-se de apróbrios as pobres criaturas que se vendem por alguns escudos ao homem que passa; a fome e a necessidade absolvem essas uniões efêmeras; enquanto a sociedade tolera, anima a união imediata, bem mais horrível, de uma donzela cândida e de um homem que apenas conhece há três meses - essa é vendida para toda a vida.





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