A Dama Pé-de-Cabra - Cap. 2: Trova Segunda Pág. 6 / 27

Trova Segunda

I

Era um dia ao anoitecer: D. Inigo estava à mesa, mas não podia cear, que grandes desmaios lhe vinham ao coração. Um pajem muito mimoso e privado, que, em pé diante dele, esperava seu mandar, disse então para D. Inigo:

- Senhor, porque não comeis?

- Que hei-de eu comer, Brearte, se meu senhor D. Diogo está cativo de mouros, segundo rezam as cartas que ora dele são vindas?

- Mas seu resgata não é a vossa mofina: dez mil peões e mil cavaleiros tendes na mesnada de Biscaia: vamos correr terras de mouros: serão os cativos resgate de vosso pai.

- O perro de el-rei de Leão fez sua paz com os cães de Toledo e são eles que têm preado meu pai. Os condes e potestades do rei tredo e vil não deixariam passar a boa hoste de Biscaia.

Quereis vós, senhor, um conselho, e não vos custará nem mealha?

Dize, dize lá, Brearte.

- Porque não ides à serra procurar vossa mãe? Segundo ouço contar aos velhos, ela é grande fada?

Que dizes tu, Brearte? Sabes quem é minha mãe e que casta é de fada?

- Grandes história tenho ouvido do que se passou certa noite neste castelo: éreis vós pequenino, e eu ainda não era nado. Os porquês destas histórias, isso Deus é que os sabe.

Pois dir-to-eis eu aogra. Chega-te para cá, Brearte.

O pajem olhou de roda de si, quase sem o querer, e chegou-se mais para seu amo: era a obediência e, ainda mais, certo arrepio de medo que o faziam chegar.

- Vês tu, Brearte, aquela fresta entaipada? Foi por ali que minha mãe fugiu. Como e porquê, aposto que já to hão contado?

- Senhor, sim! Levou vossa irmã consigo...

- Responder só ao que pergunto! Sei disso. Agora cal-te. O pajem pôs os olhos no chão, de vergonha; que era humildoso e de boa raça.





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