Belchior tinha em uma das mãos o vasto chapéu de palha, que arrastava pelo chão, e com a outra empunhava, não um ramalhete, mas um enorme feixe de flores de todas as qualidades, à sombra das quais procurava eclipsar sua desgraciosa e extravagante figura. Parecia um desses vasos de louça, de formas fantásticas e grotescas, que se enchem de flores para enfeitar bufetes e aparadores.
- Valha-me Deus! - pensou Isaura ao dar com os olhos no jardineiro. - Que sorte é a minha! ainda mais este!... este ao menos é de todos o mais suportável: os outros me amofinam, e atormentam: este as vezes me faz rir. - Muito bem aparecido, senhor Belchior! então, o que deseja?
- Senhora Isaura, eu... eu... vinha..., - resmungou embaraçado o jardineiro. - Senhora!... eu senhora!...
- Também o senhor pretende caçoar comigo, senhor Belchior?...
- Eu caçoar com a senhora!... não sou capaz... minha língua seja comida de bichos, se eu faltar com o respeito devido à senhora... Vinha trazer-lhe estas froles, se bem que a senhora mesma é uma frol...
- Arre lá, senhor Belchior!... sempre a dar-me de senhora!... se continua por essa forma, ficamos mal, e não aceito as suas froles... Eu sou Isaura, escrava da senhora D. Malvina; ouviu, senhor Belchior!
- Embora lá isso; e soverana cá deste coração, e eu, menina, dou-me por feliz se puder beijar-te os pés. Olha, Isaura...
- Ainda bem! Agora sim; trate-me desse modo.
- Olha, Isaura, eu sou um pobre jardineiro, lá isso é verdade; mas sei trabalhar, e não hás de achar vazio o meu mealheiro, onde já tenho mais de meio mil cruzados. Se me quiseres, como eu te quero, arranjo-te a liberdade, e caso-me contigo, que também não és para andar aí assim como escrava de ninguém.
- Muito obrigada pelos seus bons desejos; mas perde seu tempo, senhor Belchior. Meus senhores não me libertam por dinheiro nenhum.