O seu amigo houvera-se tão bem nessa ocasião que ninguém suspeitara deles e pudera repousar em paz até se curar. Foram tantas e tão variadas as proezas que me contou que só com grande relutância não as relato, mas esta é a minha história, não a sua.
Perguntei-lhe então quais as circunstâncias do presente caso e que esperava quando fosse julgado. Respondeu-me que não tinham provas contra ele, ou, se tinham, eram muito poucas, e que dos três assaltos de que os acusavam tivera a boa fortuna de participar apenas num e que só uma testemunha o podia afirmar, o que não chegava; esperavam, no entanto, que outras aparecessem e depusessem contra ele, e por isso pensara, ao ver-me, que eu era uma delas. Se ninguém se apresentasse, era possível que fosse ilibado e, além disso, haviam-lhe dado a entender que, se aceitasse ser deportado, talvez lho consentissem sem o julgar. Contudo, não podia nem pensar nisso e julgava que de melhor grado se submeteria à forca.
Censurei-o por isso e expliquei-lhe que o fazia por dois motivos. Se fosse deportado, teria centenas de maneiras, ele que era um cavalheiro e um homem ousado e empreendedor, de voltar e talvez, até, de regressar antes de partir. Sorriu e declarou que a segunda hipótese lhe agradava mais que a primeira, pois causava-lhe horror a ideia de ser mandado para as plantações, como os Romanos mandavam os escravos condenados trabalhar nas minas. Achava a passagem para outro estado, fosse ele qual fosse muito mais tolerável na forca, e essa era também a opinião geral de todos os cavalheiros que as exigências da sorte transformavam em salteadores. No patíbulo havia, pelo menos, um fim para todas as misérias do estado presente, e quanto ao que se seguia, um homem era tão capaz de se arrepender sinceramente na última quinzena da sua vida, sob a pressão das angústias da prisão e do covil dos condenados, como nas florestas e matos da América.
