- Aqui está - respondi, tirando de sob as pregas do meu manto uma pá de trolha.
- Estás a brincar - exclamou, recuando uns passos. - Vamos é ao Amontillado.
- Seja - disse eu, voltando a guardar a pá debaixo da capa, e oferecendo-lhe o meu braço. Apoiou-se a ele pesadamente. Continuámos o nosso caminho em busca do Amontillado. Passámos por uma fila de arcos baixos, descemos, demos alguns passos e, voltando a descer, chegámos a uma cripta profunda onde o ar viciado transformava em brasido o fogo dos archotes.
Ao fundo desta cripta abria-se uma outra menos espaçosa. As suas paredes estavam revestidas de ossadas humanas empilhadas até à abóbada, à maneira das grandes catacumbas de Paris. Três das paredes desta cripta interior ainda estavam assim ornamentadas. Na quarta parede os ossos tinham sido removidos e jaziam confusamente no chão, formando em certo ponto um monte de dimensões razoáveis. Na parede assim exposta pela deslocação dos ossos via-se outra cripta ou nicho de cerca de quatro pés de profundidade, três de largura e seis ou sete de altura. Parecia que fora construída sem nenhum objectivo especial, sendo formada apenas pelo intervalo entre duas das vigas colossais que suportavam o tecto da catacumba e uma das paredes de granito maciço que limitavam o conjunto.
Era em vão que Fortunato, erguendo o archote mortiço, tentava perscrutar o interior do nicho. A luz fraca não nos permitia ver-lhe o fundo.
- Avança - disse eu. - O Amontillado está aí dentro. Quanto ao Luchesi...
- É um parlapatão - interrompeu o meu amigo, avançando em passo trémulo seguido de perto por mim. Num instante chegou ao fundo do nicho e vendo que uma parede lhe impedia a passagem, ficou estupidamente intrigado.
