- Aqueça-se então, Victorine - disse a senhora Vauquer.
- Faz muito bem, menina, em rezar a Deus para que torne o coração de seu pai mais compreensivo - disse Vautrin, puxando uma cadeira para a órfã. - Mas isso não chega. Precisaria de um amigo que se encarregasse de dizer duas ou três verdades a esse homem, um selvagem que, diz-se, tem três milhões, e que não lhe quer dar um dote. Uma bela rapariga precisa de um dote nos tempos que correm.
- Pobre criança - disse a senhora Vauquer. - Vá, minha linda, o monstro do seu pai só atrai a desgraça para ele próprio a continuar assim.
Ao ouvir essas palavras, os olhos de Victorine encheram-se de lágrimas e a viúva parou ao sinal que lhe fez a senhora Couture.
- Se pudesse, pelo menos, vê-lo, se pudesse falar-lhe, entregar-lhe a última carta da mulher - retomou a viúva do Comissário-Ordenador. - Nunca ousei pô-la no correio, ele conhece a minha letra...
- Ó mulheres inocentes, infelizes e perseguidas - gritou Vautrin, interrompendo-a -, eis onde chegaram! Daqui a alguns dias encarregar-me-ei pessoalmente dos vossos assuntos e tudo irá pelo melhor.
- Oh! Senhor - disse Victorine, deitando um olhar ao mesmo tempo húmido e ardente a este, que ficou indiferente -, se soubesse de um meio para conseguir chegar a meu pai, diga-lhe que o seu afecto e a honra da minha mãe me são mais preciosos do que todas as riquezas do mundo. Se conseguisse qualquer abrandamento da sua ira, rezarei a Deus por si. Pode estar ciente de que lhe serei reconhecida...
, - Durante muito tempo percorri o mundo - cantou Vautrin com um tom irónico.
Nesse momento, Goriot, a menina Michonneau e Poiret desceram, atraídos talvez pelo cheiro do refogado que Sylvie fazia para arranjar os restos do carneiro.
