Capítulo 1: UM EPISÓDIO NO TEMPO DO TERROR
Página 6
Prosseguiu o seu caminho em passo lento; o homem retardou então o seu, de modo a ficar a uma distância que lhe permitisse não a perder de vista. Dir-se-ia ser a sombra da pobre velha. Davam nove horas quando os dois, silenciosos, voltaram a passar diante da igreja de Saint-Laurent. Faz parte da natureza de todas as almas mesmo as mais fracas, um sentimento de calma após uma agitação violenta, pois a verdade é que se os sentimentos são infinitos os nossos órgãos são limitados. Por isso a desconhecida, sem sentir desconfiança do seu perseguidor, queria ver nele um secreto amigo, preocupado em protegê-la; associou todas as circunstâncias que haviam acompanhado as aparições do estranho; como à procura dos motivos plausíveis que se harmonizassem com aquela consoladora opinião e aprouve-lhe então reconhecer nele antes boas que más intenções. Esquecida do pânico que aquele homem acabava de provocar no pasteleiro, caminhou, em passo firme, pelas regiões superiores do arrabalde Saint-Martin. Depois de uma meia hora de caminho, aproximou-se de uma casa situada ao pé do cruzamento formado pela rua principal do arrabalde e por essoutra que conduz à barreira de Pantin. Ainda hoje este sítio é um dos mais desertos de Paris. O nordeste, passando pelos outeiros de Chaumont e de Belleville, assobiava através das casas, ou antes das choupanas esparsas por esse valezinho quase desabitado em que as vedações são muros feitos de terra e ossos. Aquele local desolado parecia o asilo natural da miséria e do desespero. O homem, que se obstinava na perseguição da pobre criatura tão ousada que ela capaz de atravessar alta noite aquelas ruas silenciosas, parecia espantado com o espectáculo que entrevia. Ficou pensativo, primeiro, e numa atitude de hesitação, debilmente iluminado por um candeeiro cuja luz indecisa a custo trespassava a neblina.
|
|
 |
Páginas: 21
|
| |
|
| |
| |
|
|
Os capítulos deste livro:
|
|
|
