A Linha de Sombra - Cap. 8: VI Pág. 133 / 155

Gotas de chuva. Enormes. Pressagiando alguma coisa. Tap. Tap. Tap...

Voltei-me, e dirigindo-me a Gambril, pedi-lhe instantemente que mantivesse a roda do leme firme, fosse de que maneira fosse. Mal conseguia falar, tal era a minha agitação. Chegara o momento fatal. Fiquei de respiração cortada. As pancadas no convés tinham cessado de modo tão inesperado como haviam começado há pouco, e um novo instante de insuportável expectativa se sucedeu; era como um torniquete apertado a que se desse mais uma volta. Penso que não cheguei a gritar, mas lembro-me de ter sentido em absoluto que mais nada, a não ser gritar, seria possível.

De súbito... - como serei eu capaz de contar? De súbito, a escuridão tornou-se água. É a única imagem menos má que consigo achar. Um denso aguaceiro cerrado, um dilúvio, começara a cair ruidosamente. Ouve-se a sua aproximação no mar; e também no ar, disso estou piamente convencido. Mas aquilo era diferente de tudo. Sem qualquer som arrastado ou desentorpecer preliminar, sem o menor chapinhar na água e, até, sem o vestígio ainda só tacteante de um primeiro contacto fantasma, vi-me de um momento para o outro encharcado até aos ossos. Não era muito difícil, de resto, porque eu tinha só o pijama vestido. Fiquei com o cabelo completamente numa sopa naquele mesmo instante; a água corria-me pela pele, penetrava-me nas narinas, nos olhos e nos ouvidos. Bebi um bom trago em menos de um segundo.

Gambril, pelo seu lado, estava completamente sufocado.

Tossia que era um dó, com a tosse irregular de um doente; e eu via-o como se vê um peixe num aquário iluminado por uma luz eléctrica; uma forma ilusória e fosforescente. Com a única diferença de ele não se mover do sítio onde estava. Mas alguma coisa mais acontecia.





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