Estava o ruço de focinho levantado e Sancho Pança conseguiu-o pô-lo em pé; mas ele mal se podia suster: e Sancho, tirando dos alforjes, que também tinham caído, um pedaço de pão, deu-o ao seu jumento e parece que lhe não soube mal; e disse-lhe Sancho, como se ele o entendesse:
— Lágrimas com pão, passageiras são.
Nisto, descobriu a um lado da cova uma abertura, por onde cabia uma pessoa, se se encolhesse muito. Correu para lá Sancho Pança, e, agachando-se, entrou e viu que por dentro era espaçosa e larga, e pôde-a ver bem, porque, pelo sítio que se podia chamar teto, entrava um raio de sol, que a descobria toda. Viu também que se dilatava e alargava por outra concavidade espaçosa, e então voltou ao sítio onde estava o jumento, e, com uma pedra, principiou a desmoronar a terra da abertura, de modo que, em pouco tempo, abriu espaço por onde o jumento pôde entrar com toda a facilidade, e, agarrando-lhe pelo cabresto, principiou a caminhar por aquela gruta adiante, para ver se achava, por outro lado, alguma saída; e umas vezes ia às escuras, outras vezes com luz, mas nunca sem medo.
— Valha-me Deus todo-poderoso! — dizia entre si — isto que para mim é desventura, melhor fora aventura para meu amo D. Quixote. Ele sim, que tomaria estas profundidades e masmorras por jardins vistosos e palácios de Galatéia, e esperaria sair desta escuridão e estreiteza para algum florido prado; mas eu, sem ventura, falto de conselho e menoscabado de ânimo, a cada passo imagino que, debaixo dos pés, se me há-de abrir de improviso outra cova mais profunda que a primeira, que acabe de me tragar, porque um mal nunca vem só.
Deste modo, e com estes pensamentos, lhe pareceu que teria caminhado pouco mais de meia légua, ao cabo da qual descobriu uma confusa claridade, que supôs ser já a do dia, e que entrava por algum lado, o que dava indício de ter saída e fim aquele caminho, que se diria ser o da outra vida.