O Escaravelho de Ouro - Cap. 1: O escaravelho de ouro Pág. 16 / 38

Pegando então numa pá e dando as outras a Júpiter e a mim, Legrand pediu-me que começássemos a escavar o mais depressa possível.

A falar francamente nunca apreciei particularmente semelhantes exercícios, e muito menos naquela altura; a noite caía e eu estava já muito cansado com a caminhada. Não vi, porém, maneira de escapar-lhe, e tive medo que uma recusa perturbasse mais a aparente serenidade do meu amigo. Se pudesse contar com a ajuda de Júpiter não teria hesitado em conduzir Legrand à força para casa. Mas conhecia muito bem o velho negro e sabia que ele nunca se poria do meu lado contra o seu amo. Não tinha dúvidas de que este estava dominado por uma dessas superstições do Sul acerca de tesouros escondidos e que essa convicção fora reforçada pela descoberta do escaravelho ou talvez pela obstinação de Júpiter em afirmar que era um «esca'avelho de ou'o vedadei'o». Semelhantes sugestões eram de molde a perturbar um espírito já propenso à loucura, sobretudo quando vinham apoiar ideias preconcebidas. Lembrei-me também das palavras de Legrand quando dissera que o escaravelho lhe indicaria a fortuna. Sentia-me, pois, profundamente impressionado e inquieto, mas resolvi-me a fazer das tripas coração - a cavar com todo o ardor para mais rapidamente convencer o meu pobre visionário do engano que alimentava no seu seio.

Acendemos as lanternas e atirámo-nos ao trabalho com um zelo digno de uma causa mais racional. E enquanto a luz banhava as nossas pessoas e utensílios, não pude deixar de pensar no pitoresco grupo que compúnhamos e em como a nossa tarefa deveria parecer estranha a quem quer que por acaso aparecesse por ali.

Durante duas horas cavámos sem descanso. Pouco falámos; apenas nos perturbavam os latidos do cão, que parecia extremamente interessado no nosso trabalho.





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