O Homem da Multidão - Cap. 1: O homem da multidão Pág. 9 / 11

Um relógio estridente bateu as onze, e toda a gente se apressou a abandonar o bazar. Um lojista, ao colocar um taipal, empurrou o velho, e vi instantaneamente um forte estremecimento sacudir-lhe o corpo. Precipitou-se para a rua, olhou ansiosamente em redor por um momento e a seguir desatou a correr com incrível rapidez por entre várias ruas sinuosas e desertas, até desembocarmos novamente na grande artéria de onde havíamos partido - a rua do Hotel D... No entanto, o aspecto da rua já não era o mesmo. Brilhava ainda sob a luz do gás; mas a chuva tombava violentamente e viam-se poucas pessoas. O estranho empalideceu. Deu taciturnamente alguns passos ao longo da avenida antes apinhada de gente e depois, com um pesado suspiro, virou em direcção ao rio e, metendo por uma série de caminhos tortuosos, acabou por ir parar defronte de um dos principais teatros. A sala estava prestes a encerrar, e o cacho público atravessava as portas de saída. Vi o velho arquejar como a ganhar fôlego ao embrenhar-se na multidão; mas pareceu-me que a intensa agonia da sua expressão se desvanecera em certa medida. Deixou novamente pender a cabeça sobre o peito, e pareceu-me tal qual o vira pela primeira vez. Reparei que agora tomava o rumo segundo o qual a maior parte do público avançava - mas, de maneira geral, era-me difícil compreender as suas, caprichosas atitudes.

À medida que ele progredia, o grupo começou a rarear, e ele revelou novamente o mal-estar e a hesitação anteriores. Durante algum tempo seguiu de perto um grupo de uns dez ou doze foliões, mas os seus componentes foram, um a um, ficando pelo caminho, até restarem apenas três, numa estreita e lúgubre rua pouco frequentada. O estranho deteve-se e, por instantes, pareceu perdido em pensamentos; depois, com todos os indícios de agitação, meteu rapidamente por um caminho que nos levou à orla da cidade, em zonas muito diferentes das que até então tínhamos atravessado.





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