A Vida Amorosa de Moll Flanders - Cap. 2: A vida amorosa de Moll Flanders Pág. 119 / 359

Mas, embora nos fossem comuns todas as familiaridades de marido e mulher, nunca sugeriu levar mais longe as suas intimidades, do que muito se orgulhava. Não digo que, pessoalmente, tal atitude me agradasse muito, mas eu era muito mais pecadora do que ele, como adiante vereis.

Vivemos assim, quase dois anos, durante os quis foi três vezes a Londres, demorando-se de uma delas quatro meses, mas, a verdade seja dita, deixou-me sempre dinheiro suficiente para me manter com dignidade.

Se continuássemos a proceder desse modo, confesso que teríamos muito de que nos vangloriar, mas, como dizem as pessoas sensatas, é mau levar demasiado longe as tentações, e tivemos a prova disso. Para lhe fazer justiça, porém, devo confessar que a primeira quebra do compromisso não partiu dele, mas de mim, em certa noite que nos deitámos os dois, quentes e alegres e tendo bebido um pouco mais de vinho do que era habitual, embora não tanto que nos transtornasse a cabeça. Apertada nos seus braços, depois de certas loucuras que não posso descrever, disse-lhe, repito-o com vergonha e horror, que o meu coração consentia em desobrigá-lo da sua promessa apenas por uma noite, nada mais.

Pegou-me imediatamente na palavra e, depois disso, não me foi possível resistir-lhe, nem, confesso-o, era minha intenção fazê-lo, fossem quais fossem as consequências.

Assim se quebrou o encanto da nossa virtude e eu troquei o título de amigo pelo apodo dissonante e desagradável de amante. De manhã arrependemo-nos ambos; eu chorei desesperadamente e ele afirmou que la- mentava muito; mais, ai de nós!, nada mais podíamos fazer. Aberto, assim, o caminho e removidas as barreiras da virtude e da consciência, menos obstáculos tivemos depois de vencer.

Durante o resto da semana a nossa conversa foi muito melancólica e insípida.





Os capítulos deste livro