A Mulher de Trinta Anos - Cap. 3: Aos trinta anos Pág. 112 / 205

O senhor de Vandenesse encontrou a marquesa durante essa tarde como sempre fora: simples e afetuosa, verdadeira na sua dor, feliz por ter um amigo, orgulhosa por encontrar uma alma que soubesse compreender a sua; não ia mais além, e não supunha que uma mulher se pudesse deixar seduzir duas vezes; mas conhecera o amor e guardava-o ainda sangrando no fundo do seu coração; não imaginava que a felicidade pudesse apresentar suas fascinações por duas vezes a uma mulher, porque não acreditava unicamente no espírito, mas na alma; e para ela o amor não era uma sedução,. a todas as seduções nobres. Nesse momento, Carlos tornou-se jovem, viu-se subjugado pelo brilho de um grande caráter, e quis ser iniciado em todos os segredos dessa existência despedaçada mais pelo acaso que por uma falta. A senhora d’Aiglemont contentou-se em lançar um olhar ao seu amigo, ouvindo-o pedir explicações da excessiva mágoa que comunicava à sua beleza todas as harmonias da tristeza; porém esse olhar profundo foi como o selo de um contrato solene.

- Não me faça mais perguntas semelhantes - disse a marquesa. - Faz hoje quatro anos que o homem que eu amava, o único a cuja felicidade teria sacrificado até a estima de mim mesma, morreu, e morreu para me salvar a honra. Esse amor cessou, novo, puro, cheio de ilusões. Antes de me entregar a uma paixão para a qual me impelia uma fatalidade , fora seduzida pelo que perde tantas moças, por um homem sem atributo algum, mas de aparência agradável. O casamento desfolhou uma por uma todas as minhas esperanças. Perdi hoje a felicidade legítima e a outra que se chama criminosa, sem nunca a ter conhecido. Nada me resta. Se eu não souber morrer, devo, ao menos, conservar-me fiel às minhas recordações.

A essas palavras, não chorou, abaixou os olhos e torceu ligeiramente os dedos num gesto que lhe era habitual.





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