A Utopia - Cap. 3: Capítulo 3 Pág. 130 / 133

não pode viver? Depois de terem gasto a sua mocidade e vigor, são no fim da vida atormentados pela doença e pela velhice, pobres, sem coisa alguma, de quem esqueceram as vigílias trabalhosas e numerosos serviços, recompensando-os apenas com a mais miserável morte.

E, ainda por cima, os ricos arrancam-lhes parte do que eles conseguem arranjar, quer por meio de fraude, quer extorquindo-os pela lei. E se até aí recompensar com a ingratidão o trabalho de quem tanto bem fez à república era uma injustiça flagrante, passaram agora a dar a esta injustiça o nome de justiça, sancionando-a com a lei.

Por isso, quando considero e comparo todas estas repúblicas, tão florescentes hoje em dia, Deus me perdoe, não vejo senão uma enorme conspiração dos ricos para alcançarem o seu próprio bem, em nome da república. Inventam e usam de toda a habilidade para atingir um duplo fim: Primeiro, garantir-se, com segurança, o que injustamente adquiriram; e, depois, apoderar-se e abusar do serviço dos pobres, pela paga mais mesquinha possível. Destas maquinações, decretadas pelos ricos, em nome da república, e por isso também em nome dos pobres, fazem os poderosos as leis.

Contudo, ainda que esses homens perversos tenham conseguido dividir entre si todos os bens, com insaciável avidez, bens que seriam suficientes para toda a gente, esses ricos, como dizia, estão longe de gozar a felicidade que os Utopianos usufruem. Pois estes últimos baniram completamente o uso do dinheiro, cortando pela raiz grande quantidade de males e pesares.

Pois quem ignora que a fraude, o roubo, a rapina, as rixas, os tumultos, as lutas, os assassínios, os envenenamentos, todos esse crimes vingados diariamente, mas não refreados pelo castigo,





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