Benzeu-se vinte vezes, para não ter lá de persignar-se. Rezou o Pater, a Ave e o Credo; porque não sabia se em breve essas orações seriam coisa de recordar-se.
E, seguido de um mastim seu predilecto, a pé e com uma ascuma na mão, foi-se através das brenhas, por uma vereda que dizia para os píncaros tristes e ermos onde era tradição que a linda dama tinha aparecido a seu pai.
II
Trinam os rouxinóis nos balseiros, murmuram ao longe as águas dos regatos; ramalha a folhagem brandamente com a viração da manhã: vai uma linda madrugada.
E Inigo Guerra galga, manso e manso, os carris empinados, trepa de barrocal em barrocal e, apesar de seu muito esforço, sente bater-lhe o coração com ânsia desacostumada.
Onde as matas faziam alguma clareira ou as penhas alguma chapada, D. Inigo parava um pouco, tomando o fôlego e pondo-se a escutar.
Muito havia que andava embrenhado: o Sol ia alto, e o dia calmoso: ao canto do rouxinol seguira o rechiar da cigarra.
E encontrou uma fonte que rebentava de rochedo negro e, saltando de aresta em aresta, vinha cair em almácega tosca, onde o Sol parecia dançar no bulir das ondazinhas que fazia o despenho da cascata.
D. Inigo assentou-se à sombra da rocha e, tirando a sua monteira, matou a sede que trazia, e pôs-se a lavar o rosto e a cabeça do suor e pó, que não lhe faltava.
O mastim, depois de beber, deitou-se ao pé dele e, com a língua pendente, arquejava de cansado.
De repente, o cão pôs-se em pé e arremeteu, com um grande ladro.
D. Inigo volveu os olhos: um jumento silvestre pascia na orla da clareira junto de um frondoso carvalho.
- Tárik ! - gritou o mancebo. - Tárik! - Mas Tárik ia avante e não escutava.
Ai, deixa-o correr, meu filho! Não é para o teu mastim levar a melhor desse ónagro.