Agora encontrava-me, sem dúvida, no apogeu do que podia chamar a minha prosperidade e nada mais desejava do que ser esposa, o que, in- felizmente, era impossível naquele caso. Por isso tratei sempre de poupar o máximo, em todas as circunstâncias, pois não ignorava que as situações como aquela não duravam eternamente; os homens que mantêm amantes substituem-nas com muita frequência, por ciúme, cansaço ou qualquer coisa que os leva a pôr fim às suas benesses. As vezes são as próprias mulheres que não sabem adoptar uma conduta prudente, para preservarem a estima da sua pessoa, ou que não são fiéis, acabando, assim, por serem justamente repudiadas com desdém.
Mas eu estava segura a esse respeito, pois, como não tinha o mínimo desejo de mudar de situação, não travei relações de espécie nenhuma em toda a casa e fiquei, assim, livre de tentações. Dava-me apenas com a família com a qual habitava e com a esposa de um clérigo da porta ao lado, de maneira que, quando o meu amigo estava ausente, eu não visitava ninguém, nem ele me encontrava nunca fora do meu quarto ou da minha sala. Se ia a algum lado para tomar ar, fazia-o sempre na sua companhia.
A nossa vida em comum era, com certeza, a menos intencional do mundo e o meu amigo confessou-me muitas vezes que, desde que me conhecera e até à própria noite em que quebráramos a nossa promessa, não tivera o mínimo intuito de se tornar meu amante; sempre sentira por mim um grande afecto, mas nunca havia tido a intenção de fazer o que fizera. Pelo meu lado, afirmava-lhe que também nunca suspeitara de que fossem esses os seus intuitos, pois, caso contrário, jamais consentiria tão facilmente nas liberdades de que tudo resultara; fora uma surpresa para mim e devida ao acidente de havermos cedido demasiado aos nossos desejos naquela noite.
