- Estou certo também de que o sou. Mas sou mais que isso, minha senhora, pois, para ser franco consigo, sou um marido atraiçoado e ela uma cortesã. - Falava em tom de brincadeira, mas com um sorriso tão constrangido e tão desesperado que percebi ser verdade.
- Isso modifica a situação a respeito do que o senhor disse, mas um marido traído pode ser um homem honesto e, portanto, a situação não se modifica a meu respeito. Além disso, penso que, sendo a sua mulher tão traidora para si, o senhor só dá provas de dignidade ao continuar a considerá-la sua esposa, mas com isso não tenho eu nada.
- Continuo a considerá-la minha esposa, mas, para ser franco, confesso que também não sou um marido traído e resignado. Pelo contrário, esta situação irrita-me quanto é possível imaginar, mas nada posso fazer. Quem nasceu para cortesã será cortesã.
Mudei de assunto e recomecei a falar do meu caso, mas ele não se conformou e não tive outro remédio senão ouvi-lo. Contou-me todos os pormenores da sua situação, assaz longos para os relatar aqui, dizendo-me, entre outras coisas, que, tendo-se ausentado de Inglaterra algum tempo antes de ocupar o lugar que desempenhava, a mulher dera à luz dois filhos de um oficial do Exército. Ao regressar recebera-a de novo por se mostrar submissa, e mantivera-a muito bem, mas mesmo assim ela fugira com um ajudante de fanqueiro, roubara-lhe tudo quanto pudera e continuava a viver fora do lar.
- Portanto, minha senhora, ela não é meretriz por necessidade, como geralmente acontece, mas por tendência e por vício.
Lamentei-o, desejei-lhe que se visse livre dela e tentei de novo falar dos meus assuntos, mas debalde.