Se essa vida houvesse durado, se eu houvesse aprendido, no tempo em que a gozei, a saborear a sua verdadeira doçura e não tivesse mergulhado na pobreza, que é a perdição infalível da virtude, como teria sido feliz, não só então, mas talvez sempre! Enquanto assim vivi fui uma penitente sincera do meu passado, um passado que recordava com náusea e que, posso dizê-lo sem mentir, me fazia odiar a mim própria. Quantas vezes pensei na maneira como o meu amante de Bath, tocado pela mão de Deus, se arrependera e me abandonara, recusando-se a voltar a ver-me, não obstante amar-me tanto! Mas eu, aguilhoada pelo pior dos demónios - a pobreza -; voltara aos ardis reles e aproveitara-me daquilo a que é costume chamar-se um palminho de cara para prover às minhas necessidades, fizera da beleza um alcaiote do vício.
Agora parecia aconchegada num porto seguro, após a viagem tempestuosa do passado, e começava a sentir-me grata por isso. Passei muitas horas sozinha, a chorar as passadas loucuras e os excessos desvairados de uma vida pecaminosa, convencida, quantas vezes, de que me arrependera sinceramente.
Mas há tentações a que a natureza humana não permite resistir, e poucos sabem o que seria a sua vida se se vissem perante tais exigências. Assim como a cobiça é a origem de todas as desgraças, assim a pobreza é, creio, a pior de todas as armadilhas. Mas adio estas considerações para ocasião mais oportuna.
Vivi com este marido na maior harmonia e tranquilidade; era um homem pacato, sério e calmo, virtuoso, modesto e sincero, e diligente e justo nos seus negócios. Estes eram de natureza restrita, mas rendiam-lhe o suficiente para uma vida abastada, embora sem exageros. Não chegavam para manter uma equipagem ou fazer figura, como sói dizer-se, mas eu também não o esperava nem desejava, pois aborrecia a leviandade e a extravagância da minha vida passada e preferia uma existência frugal e recatada, fechada connosco.
