Vivemos durante cinco anos neste caminho ininterrupto de satisfação e tranquilidade, até que um golpe súbito, desfechado por mão quase invisível, despedaçou a minha felicidade e me deixou numa situação absolutamente inversa.
O meu marido confiara a um dos seus colegas determinada soma em dinheiro, o colega faliu e a perda, excessivamente grande em relação aos nossos meios, abalou de maneira extraordinária o meu marido. No entanto, se ele tivesse ânimo e coragem para olhar de frente o infortúnio, o prejuízo não era tão grande nem o seu crédito tão pequeno - antes pelo contrário, como eu própria lhe disse - que não se refizesse com relativa facilidade. Ceder às dificuldades é duplicar o peso das mesmas e quem o faz sucumbe esmagado por elas.
Em vão tentei confortá-lo; a ferida era demasiado funda, era como uma punhalada que lhe tivesse ofendido os órgãos vitais. Tornou-se melancólico, desesperançado, letárgico - e morreu. Previ a desgraça e senti-me oprimida e angustiada, visto compreender perfeitamente que a sua morte seria a minha ruína.
Tivera dele apenas dois filhos, pois, para dizer a verdade, com 48 anos começava a ser altura de deixar de os conceber. Creio que, mesmo que ele não morresse, não teria tido mais.
Encontrava-me agora numa situação desesperada e, em certos aspectos, pior que nunca. Em primeiro lugar, passara aquele período viçoso da minha vida em que podia esperar ser desejada como amante; era história antiga, de que só restavam ruínas, e, pior que tudo isso, sentia-me a criatura mais triste e desanimada do mundo. Eu, que encorajara o meu marido e tudo fizera para lhe incutir ânimo na sua provação, não tinha forças para suportar a minha, faltava-me a coragem que tantas vezes lhe dissera ser indispensável para que o peso do infortúnio não nos esmagasse.