As paixões que durante séculos tinham caracterizado a nossa raça surgiram em tropel com as fantasias que igualmente a haviam celebrizado, e umas e outras bafejavam de uma bem-aventurança delirante o Vale da Relva Multicor. Produziu-se uma súbita modificação em todas as coisas. Estranhas flores brilhantes, em forma de estrela, desabrocharam nas árvores onde até então não se vira nenhuma. As tonalidades do tapete verdejante tornaram-se mais profundas; e quando, um a um, os malmequeres brancos se fecharam, brotaram, em seu lugar, dezenas de asfódelos cor de rubi. E a vida irrompeu sob os nossos passos, pois o grande flamingo, até esses dias ausente, exibiu diante de nós a sua plumagem escarlate; peixes dourados e prateados juncaram o rio, de cujo leito se ergueu, a pouco e pouco, um sussurro que acabou por crescer até se tornar numa embaladora melodia mais divina que a da harpa de Éolo, mais doce do que tudo excepto a voz de Eleonora. E depois também uma nuvem volumosa, que tínhamos visto durante muito tempo nas regiões do Hésper, deslizou para além destas, deslumbrante de ouro e carmesim, e, pairando em paz sobre nós, desceu, dia após dia, cada vez mais baixo, até os seus bordos pousarem nos cumes das montanhas, convertendo em magnificência todo o seu anterior carácter sombrio e encerrando-nos, como que para sempre, numa prisão mágica de esplendor e glória.
O encanto de Eleonora era o dos Serafins; era, porém, uma donzela sem artifícios e tão inocente como a curta vida que até então levara entre as flores. Nenhuma astúcia mascarava o fervor da paixão que lhe animava o coração, e perscrutava comigo os seus mais íntimos recônditos ao passearmos juntos no Vale da Relva Multicor, discorrendo sobre as grandes transformações que ultimamente nele se tinham operado.
