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Capítulo 1: Ligeia

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Contudo, nem assim poderia definir tal sentimento, analisá-lo ou sequer apercebê-lo com nitidez. Reconheci-o por vezes, repito, na investigação de uma vinha em rápido crescimento, na contemplação de uma falena, de uma borboleta, de uma crisálida, de um curso de água. Senti-o no oceano; senti-o na queda de um meteoro; senti-o nos olhares das pessoas extremamente idosas. E há no céu uma ou duas estrelas (especialmente uma delas, uma estrela de sexta grandeza, dupla e mutável, que se pode encontrar perto da estrela maior da Lira) em cuja observação telescópica me dei conta de tal sentimento. Experimentei-o plenamente com certos sons de instrumentos de cordas, e com alguma frequência através de passagens de livros. Entre outros inúmeros exemplos, lembro-me bem de algo retirado de um livro de Joseph Glanvill que (talvez unicamente pela sua singularidade, quem sabe?) nunca deixou de inspirar-me esse sentimento: «E existe ali a vontade, que não morre. Quem conhece os mistérios da vontade, ou o seu vigor? Porque Deus não é mais que uma suprema vontade que penetra todas as coisas por natureza da sua intencionalidade. O homem não se entrega aos anjos, nem totalmente à morte, a não ser pela fraqueza da sua débil vontade.» O decorrer dos anos e a subsequente reflexão permitiram-me detectar, efectivamente, alguma remota ligação entre esta passagem do filósofo inglês e uma parte do carácter de Ligeia. Uma intensidade no pensamento, na acção ou na fala constituía possivelmente, nela, resultado, ou pelo menos indício, de uma gigantesca volição que, durante a nossa longa relação, não pôde dar outra ou mais evidente prova da sua existência. De todas as mulheres que jamais conheci, ela, a exteriormente calma e sempre plácida Ligeia, era o mais violentamente presa dos tumultuosos abutres da implacável paixão.

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Páginas: 20
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Ligeia 1