O Pai Goriot - Cap. 1: O PAI GORIOT Pág. 107 / 279

A honestidade não leva a nada. As pessoas vergam-se perante o poder do génio, odeiam-no, tentam difamá-lo, porque ele toma sem dividir; mas vergam se ele persistir; numa palavra, é-se adorado de joelhos quando não se conseguiu enterrá-lo na lama. A corrupção tem força, o talento é raro. Por isso, a corrupção é a arma da mediocridade que abunda e sentirá por todo o lado a sua lâmina. Verá mulheres cujos maridos têm 6000 francos de salário para sobreviver e que gastam mais de 10000 francos só para se vestirem. Verá empregados a 1200 francos comprar terras. Verá mulheres prostituírem-se para irem andar no carro do filho de um membro da Câmara Alta de França, que pode correr em Longchamp na via do meio. Viu o pobre ignorante do pai Goriot obrigado a pagar a letra de câmbio endossada pela filha, cujo marido tem 50 000 libras de rendimento. Desafio-o a fazer dois passos em Paris sem encontrar tramóias infernais. Apostaria a minha cabeça em como entrará num covil na casa da primeira mulher que lhe agradar, mesmo que seja rica, bela e jovem. Todas agem conforme as leis, em guerra com os maridos por tudo e por nada. Nunca acabaria se tivesse de lhe explicar as intrigas que se fazem por amantes, por trapos, por crianças, pelo lar ou pela vaidade, raramente por virtude, esteja certo disso. Assim, o homem honesto é o inimigo comum. Mas o que pensa que seja o homem honesto? Em Paris, o homem honesto é aquele que se cala e recusa partilhar o que tem. Não lhe falo desses pobres escravos que por todo o lado fazem o trabalho sem nunca serem recompensados pelos seus esforços e que eu chamo da confraria dos chinelos do Senhor. Sem dúvida que aí está a virtude com a sua estupidez em flor, mas aí está também a miséria. Vejo daqui a careta dessas pessoas se Deus nos fizesse a brincadeira de mau gosto de se ausentar no último julgamento.




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