O Pai Goriot - Cap. 1: O PAI GORIOT Pág. 162 / 279

Dois dias depois, Poiret e a menina Michonneau estavam sentados num banco, ao sol, numa ala solitária do Jardim das Plantas, e falavam com o senhor que parecia, com razão, suspeito ao estudante de Medicina. - Menina - dizia o senhor Gondureau -, não vejo de onde vêm os seus escrúpulos. Sua Excelência o Senhor Ministro da Polícia do Reino... , - Ah! Sua Excelência ocupa-se deste assunto... - repetiu Poiret.

- Sim, Sua Excelência trata deste assunto - disse Gondureau.

A todos parecerá inverosímil que Poiret, antigo empregado, talvez um homem de virtudes burguesas, embora com falta de ideias, continuasse a ouvir o dito capitalista da Rua de Bouffon, no momento em que este pronunciou a palavra polícia deixando assim entrever a fisionomia de um agente da Rua Jérusalem por entre a máscara de homem honesto? No entanto nada era mais natural. Todos compreenderão melhor a particular espécie à qual pertencia Poiret, na grande família dos estúpidos, após uma anotação já feita por alguns observadores, mas que até agora não foi publicada. Existe uma nação de letrados, apertados no orçamento, que se encontra no primeiro degrau da latitude que engloba os ordenados de 1200 francos, espécie de Groenlândia administrativa, e o terceiro degrau, onde começam os ordenados um pouco mais quentes de 3 a 4000 francos, região temperada, onde se aclimata a gratificação, onde ela floresce apesar das dificuldades da cultura. Um dos traços característicos que melhor trai a enorme estreiteza dessas pessoas subalternas é uma espécie de respeito involuntário, maquinal, instintivo, para com essa grande lama de qualquer ministério, conhecido pelo empregado por uma assinatura ilegível e sob o nome de Sua Excelência o Senhor Ministro, cinco palavras que equivalem a Il Bondo Cani du Calife de Bagdad, e que, aos olhos desse povo esmagado, representa um poder sagrado, sem recurso.





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