O Pai Goriot - Cap. 1: O PAI GORIOT Pág. 214 / 279

Eis um dia que me carrega mais dez anos em cima da cabeça. Ficarei doida, palavra de honra! Que fazer dos feijões? Ah! Pois bem, se estou sozinha aqui, irás embora amanhã, Christophe. Adeus, senhores, boa noite.

- O que é que ela tem? - perguntou Eugène a Sylvie.

- Enfim, parece que toda a gente parte por causa dos acontecimentos - virou-lhe a cara. - Vamos, estou a ouvi-la chorar. Vai fazer-lhe bem choramingar. É a primeira vez que esvazia os olhos desde que trabalho para ela.

No dia seguinte, a senhora Vauquer tinha-se, segundo uma sua expressão, conformado. Se pareceu afligida como uma mulher que tinha perdido todos os pensionistas e cuja vida estava transtornada, tinha a cabeça no lugar e mostrou o que era a dor verdadeira, uma dor profunda, a dor causada pelo interesse enxovalhado, pelos hábitos rompidos. Sem dúvida que o olhar que lança um amante sobre os lugares habitados pela amante, ao deixá-los, não é mais triste do que foi o da senhora Vauquer perante a mesa vazia. Eugène consolou-a dizendo-lhe que Bianchon, que acabava o internato dentro de alguns dias, viria provavelmente ocupar o lugar dele, que o empregado do Museu de História Natural tinha muitas vezes manifestado o desejo de ter o apartamento da senhora Couture, e que em poucos dias voltaria a ter a casa cheia.

- Deus vos ouça, meu querido senhor! Mas a desgraça está cá. Dentro de dez dias, a morte baterá neste lugar, vai ver - disse ela, deitando um olhar lúgubre à sala de jantar. - Quem virá ela buscar?

- Sabe bem mudar de lugar - disse em voz baixa Eugène ao pai Goriot.

- Senhora - disse Sylvie, acorrendo, desorientada -, há três dias que não vejo o Mistigris.

- Ah! Ora, se o meu gato está morto, se nos deixou, eu...

A pobre viúva não acabou, juntou as mãos e deixou-se cair de costas no cadeirão arrasada por este terrível prognóstico.





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