O jovem apresentou-se desolado a Delphine e encontrou-a penteada, calçada, só lhe faltando vestir o vestido de baile. Mas, tal como as pinceladas com as quais os pintores finalizam os quadros, os últimos preparativos necessitavam de mais tempo do que todo o fundo da tela.
- Então, ainda não está vestido? - disse esta.
- Mas, senhora, seu pai...
- Outra vez meu pai - gritou, interrompendo-o. - Não irá ensinar-me aquilo que devo a meu pai. Conheço meu pai há muito. Nem uma palavra, Eugène. Só irei ouvi-lo quando estiver preparado. Thérèse preparou tudo na sua casa, o meu carro está pronto, levai-o e voltai. Falaremos de meu pai indo para o baile. Temos de partir cedo, se ficamos presos na fila de carros, teremos sorte de chegar por volta das 11 horas.
- Minha senhora!
- Vá! Nem uma palavra - disse, correndo para a sua salinha para ir buscar o colar.
- Mas ide, senhor Eugène, irá fazer zangar a senhora - disse Thérèse, empurrando o jovem rapaz assustado com essa elegante parricida.
Foi vestir-se fazendo as mais tristes, mais desesperantes reflexões. Via. o mundo como um oceano de lama no qual um homem mergulhava até ao pescoço, se lá pusesse o pé. «Só se cometem aqui crimes mesquinhos!», pensou. «Vautrin é maior. Viu as três grandes expressões da sociedade: a obediência, a luta e a revolta; a família, o mundo e a luta incerta.» O pensamento levou-o para junto da família. Lembrou-se das emoções puras dessa vida calma, lembrou-se dos dias passados no meio dos seres por quem era querido. Conformando-se às leis naturais do lar doméstico, essas queridas criaturas lá encontravam a felicidade plena, contínua, sem angústias. Apesar dos seus bons pensamentos, não se sentiu com coragem para vir pregar a fé dás almas puras a Delphine, exigindo-lhe a virtude em nome do amor.
