O Pai Goriot - Cap. 1: O PAI GORIOT Pág. 97 / 279

Por fim, o pássaro que antes não tinha asas reencontrou todo o seu fulgor. O estudante sem dinheiro agarra um instante de prazer como um cão rouba um osso por entre mil perigos, parte-o, chupa-o e continua a correr; mas o jovem que faz tilintar no seu bolsinho algumas moedas de ouro perdidas degusta esses prazeres, esmiúça-os, compadece-se neles, balança-se no céu, já não sabe o que significa a palavra miséria. Paris pertence-lhe por inteiro. Idade em que tudo brilha, cintila e arde! Idade de felicidade alegre que ninguém aproveita, nem o homem, nem a mulher! Idade das dívidas e dos temores vivos que multiplicam todos os prazeres! Quem não percorre a margem esquerda do Sena, entre a Rua de Saint-jacques e a Rua des Saints-Peres, não conhece nada à vida humana! «Ah! Se as mulheres de Paris soubessem!», pensava Rastignac devorando as pêras cozidas, a um real a peça, servidas pela senhora Vauquer, 'viriam fazer-se amar aqui. Nesse momento, um correio da posta real apresentou-se na sala de jantar, após ter tocado à porta gradeada do jardim, perguntou pelo senhor Eugène de Rastignac, a quem entregou dois sacos e um registo para assinar. Rastignac recebeu então um golpe, como se de uma chicoteada se tratasse, desferido pelo olhar profundo que lhe lançou Vautrin.

- Terá com que pagar lições de espadachim e sessões de tiro? - disse-lhe este homem.

- O dinheiro chegou - disse-lhe a senhora Vauquer olhando para os sacos.

A menina Michonneau temia deitar os olhos sobre o dinheiro, com medo de revelar a sua cobiça.

- Tem uma boa mãe - disse a senhora Couture.

- O senhor tem uma boa mãe - repetiu Poiret.

- Sim, a mamã esfolou-se viva - disse Vautrin. - Poderá agora fazer as suas macaquices, andar no mundo, pescar dotes e dançar com as condessas que têm flores de pessegueiro na cabeça.





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