O rapaz saltou a vedação e correu para a figura ali caída. A nuca e a cabeça não passavam de uma massa informe, sangue e horror em partes iguais. Virou-a então de costas. O corpo fremia ainda em rápidas convulsões, secas e breves. Mas já estava morta, já estava de facto morta. Ele sabia que assim era, sentia-o na alma e no sangue. Cumpria-se assim aquela sua necessidade interior, aquela exigência vital, imperiosa, sendo ele o sobrevivente. Sim, fora ele quem sobrevivera, arrancado que fora o espinho que até então lhe revolvera as entranhas. Assim, pousou-a gentilmente no chão. Estava morta, disso não havia dúvidas.
Erguendo-se, viu March que se quedara hirta como que petrificada, ali parada absolutamente imóvel, dir-se-ia que presa ao chão por uma força invisível. Tinha o rosto mortalmente pálido, os olhos negros transformados em dois grandes abismos aquosos, trevas e dor bailando-lhe nas pupilas. O velhote tentava escalar a vedação, horrível de ver na incoerência e no esforço.
- Receio bem que tenha morrido - disse então o rapaz.
O velhote chorava de uma forma estranha, soluçada, emitindo curiosos ruídos enquanto se apressava por sobre a vedação.
- O quê! - gritou March, como que electrizada.
- Sim, receio bem que sim - repetiu o rapaz.
March vinha agora a caminho. Adiantando-se-lhe, o rapaz atingiu a vedação antes de ela lá conseguir chegar.
- Que estás a dizer, morta, como? - perguntou em voz aguda.
- Assim mesmo, morta. Receio bem que esteja morta - respondeu ele com enorme suavidade.
Ela tornou-se então ainda mais pálida, terrivelmente pálida e branca. E ficaram ali os dois a olhar um para o outro.