Amor de Perdição - Cap. 7: Capítulo 7 Pág. 42 / 145

Nisto ouviu-se um leve rumor de folhagem no matagal para onde tinha saltado o companheiro do morto. João da Cruz, como galgo de fino olfacto, fitou a orelha e resmungou:

– Querem vocês ver que elas se armam!… Dar-se-á o caso que o outro ainda esteja por ali a tremer maleitas?!…

O rumor continuou, e logo um bando de pássaros rompeu dentre a folhagem chilreando.

– O homem está ali – tornou o ferrador. – Passe-me cá uma pistola, senhor Simão!

Correu mestre João, e ao mesmo tempo uma grande rostilhada se fez entre as moitas de codessos e urzes.

– Ele estrinça lenha como um porco do monte! – exclamou o ferrador – Ó cunhado, bate este mato com alguns penedos; quero ver sair o javali da moita!…

Para o outro lado da bouça estava um plaino cultivado. Simão, rodeando a sebe, conseguira saltar ao campo por sobre a pedra dum agueiro.

– Tenha lá mão, mestre; não vá você atirar-me! – bradou Simão ao ferrador.

– Pois o fidalgo já aí anda!? Então está fechado o cerco. Eu cá vou fazer de furão. Se este nos escapa, não há nada seguro neste mundo!

Não se enganaram. O criado de Baltasar Coutinho, quando se atirara desamparado à brenha, deslocara um joelho, e caíra atordoado. O arrieiro não examinou o efeito do tiro, porque atirara à ventura, e achava natural que o fugitivo se não molestasse. Quando volveu a si do aturdimento da queda, o homem arrastou-se até encontrar um cerrado de árvores silvestres, em que pernoitava a passarinhada. Como os melros cacarejassem, esvoaçando, o criado de Baltasar retrocedeu para o mato, cuidando que aí escaparia; mas o arrieiro jogava enormes calhaus em todas as direcções, e alguns acertavam mais que as balas do seu bacamarte. João da Cruz tirou do bolso da jaqueta um podão, e começou a cortar a selva de carvalhas novas e giestais que se emaranhavam em redor do esconderijo. Já cansado, porém, e vendo o pouco fruto do trabalho, disse ao arrieiro:

– Petisca lume, vai ali dentro buscar um pouco de restolho seco, e vamos pegar fogo ao mato, que este ladrão há-de morrer assado.





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