A Vida Amorosa de Moll Flanders - Cap. 2: A vida amorosa de Moll Flanders Pág. 294 / 359

Lamentava encontrar-me em Newgate, mas dava poucas mostras de arrependimento.

Pelo contrário, assim como a água das cavidades e recessos das montanhas petrifica e transforma em pedra seja o que for sobre que caia, assim a constante intimidade com outras desgraçadas como eu produzia em mim os mesmos efeitos nefastos que noutras pessoas. Empederni-me. Primeiro tornei-me embotada e insensível, depois rude e indiferente e, por fim, doida varrida como as outras. Em resumo, comecei a sentir-me tão bem onde estava como se lá tivesse nascido.

É quase impossível imaginar que sejamos capazes de degenerar tanto ao ponto de considerarmos agradável o que é a maior e mais completa miséria, do mesmo modo que creio quase impossível encontrar situação pior que aquela; sentia-me tão desgraçada quanto, falando em termos genéricos, é possível a alguém que tem vida, saúde e dinheiro, como eu.

Tinha na consciência um peso de culpa suficiente para fazer soçobrar qualquer pessoa que ainda possuísse uma réstia de bom senso e fosse capaz de avaliar a felicidade desta vida e a desgraça da outra. Ao princípio senti, de facto, remorso, mas não arrependimento; depois não experimentei remorso nem arrependimento. Acusava-me de um crime cujo castigo era, pela nossa lei, a morte, e as provas contra mim eram tão evidentes que não tinha a mínima base para me declarar inocente. Além disso, em virtude de o meu nome ser conhecido como o de delinquente antiga, nada tinha a esperar senão a morte dentro de poucas semanas, nem acalentava, tão-pouco, quaisquer esperanças de a tal sentença escapar; mas, mesmo assim, possuía-me uma estranha letargia de alma, passada a primeira surpresa não sentia inquietação, apreensões ou desgosto, não sentia, a bem dizer, nada.





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