Noites Brancas - Cap. 2: Capítulo 2 Pág. 21 / 67

— Sem dúvida — respondi com um rosto grave.

— Então, se não tem dúvidas, continue, pois estou ansiosa para saber como isso irá acabar.

— A Nastenka quer saber o que faz no seu reduto o nosso herói ou, dizendo melhor, o que eu faço, pois o herói de toda a história sou eu, a minha própria e modesta pessoa. Quer saber por que razão é que fiquei de tal modo perturbado e desvairado durante todo o dia, após a inesperada visita do meu amigo? Quer saber porque fiquei confundido e enrubescido quando abriram a porta do meu quarto e sucumbi tão miseravelmente ao peso da minha própria hospitalidade?

— Na verdade, quero! — respondeu Nastenka —, pois aí é que reside todo o problema. Ouça: o senhor sabe contar as coisas muito bem, mas não haveria maneira de as contar um pouco pior? Assim, quando fala, dir-se-ia que está a ler num livro.

— Nastenka! — respondi com uma voz grave e severa e fazendo esforços para não me rir —, minha querida Nastenka, bem sei que conto bem, mas, desculpe-me, não sei contar as coisas de outra maneira. Neste momento assemelho-me ao espírito do rei Salomão, que permaneceu durante mil anos encerrado numa ânfora, selada com sete selos, e que, finalmente, foi liberto desses sete selos. Neste momento, minha querida Nastenka, em que nos voltamos a reunir após uma separação tão longa, pois já a conheço há muito tempo, Nastenka, porque há já muito tempo que procurava uma certa pessoa, e isto significa que a procurava a si e que estava escrito que nos veríamos agora — neste momento, abriram-se no meu cérebro milhares de válvulas e tenho de deixar as palavras afluir em em torrente, pois, caso contrário, sufocaria. Por isso, peço-lhe que não me interrompa, Nastenka, e que me escute com submissão e docilidade. De outro modo, calar-me-ei.





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