— Como vê, sempre passaram esta noite e este dia! — disse-me ela estreitando-me ambas as mãos.
— Há já duas horas que aqui estou. Nem pode imaginar de que maneira vivi todo este longo dia!
— Eu sei, eu sei... Mas vamos ao que importa! Sabe porque vim hoje? Decerto que não foi para tagarelar tolamente, como sucedeu ontem. Doravante devemo-nos conduzir mais inteligentemente. Ontem pensei longamente em tudo isto.
— «Mais inteligentemente»; mas em quê? Pela minha parte, estou disposto a isso. Em toda a minha vida, porém, nunca me sucedeu nada que fosse mais inteligente do que aquilo que ontem se passou.
— Na verdade? Primeiramente, peço-lhe, não me aperte as mãos dessa maneira; além disso, informo-o de que reflecti hoje longamente a seu respeito.
— E então, a que conclusão chegou?
— A que conclusão? Conclui que era necessário recomeçar tudo desde o início, pois verifiquei hoje que o senhor me é ainda perfeitamente desconhecido e que ontem me comportei como uma criança, como uma rapariguinha, e concluí justamente que a culpa foi sem dúvida do meu bom coração; em suma, fiz o meu elogio, como, no fim de contas, sempre acaba por suceder quando nos dedicamos à tarefa de nos analisarmos. Assim para reparar o meu erro, decidi informar-me a seu respeito dá maneira mais pormenorizada possível. Como, porém, não conheço ninguém que me possa informar, será o senhor mesmo quem terá de me contar tudo, tudo até ao mais ínfimo pormenor. Portanto, diga-me: que espécie de homem é o senhor? Depressa, comece, conte a sua história!