— Isso não admira — respondeu Sancho — quer joguem, quer não joguem, quer ganhem, quer não ganhem, nunca podem estar contentes.
— Assim deve ser — respondeu Altisidora — mas há outra coisa, que também me admira, quero dizer, que também me admirou então, e foi que ao primeiro boléu não ficava nem uma péla capaz, nem se podia mais aproveitar; e assim, gastavam livros novos e velhos, que era mesmo uma maravilha. A um deles, novo, flamante e bem encadernado, deram uns piparotes, que lhe arrancaram as tripas e lhe espalharam as folhas. Disse um diabo para outro: “Vede que livro é esse”; e o diabo respondeu-lhe: “Este é a Segunda parte da história de D. Quixote de la Mancha, não composta por Cid Hamete, seu primeiro autor, mas por um aragonês, que diz ser natural de Tordesilhas.” “Tirai-mo daí, respondeu o outro diabo, e metei-o nos mais profundos abismos do inferno, para que o não vejam mais os meus olhos”. “Tão mau é ele?” redarguiu o outro. “Tão mau, replicou o primeiro, que, se eu de propósito me metesse a fazê-lo pior, não o conseguiria”.
Continuaram a jogar a péla com outro livro; e, por ter ouvido pronunciar o nome de D.