A Utopia - Cap. 2: Capítulo 2 Pág. 22 / 133

dos vossos escudeiros, a quem louvais a educação e justificais a preguiça. Não lhes causam, pois, receio, a menos que a estatura e a força não correspondam à sua coragem ou que os seus estômagos se encontrem demasiado enfraquecidos pela miséria. Ora, bem podeis ver como seria útil, a menos que se tenham tornado efeminados, se fossem exercitados num ofício honroso, de que pudessem tirar o sustento, fortes e bem constituídos como eles são, já que os nobres escolhem cuidadosamente as vítimas da sua corrupção, em vez de se consumirem na inacção e no ócio e amolecerem em tarefas próprias de mulheres, incapacitando-os, no futuro, para enfrentar a dureza da vida.

Na verdade, de qualquer maneira que se encare o caso, parece-me inútil, para o bem comum, manter, mesmo na hipótese de uma guerra, que, aliás, só tereis se a quiserdes, um bando tão numeroso de tais ociosos, que, em tempo de paz, se tornam incómodos e briguentos, e bem merece a paz mais cuidados que a guerra. Contudo, não é esta a única causa do roubo. Existe outra que é própria e peculiar à Inglaterra.

- Qual é ela? - perguntou o cardeal.

Os inumeráveis rebanhos de carneiros, outrora tão meigos, domesticados e sóbrios, e que agora se tornaram tão vorazes e ferozes que chegam mesmo a devorar os próprios homens. São eles a causa da destruição e despovoamento dos campos, casas e povoações. Ora reparai que, nos pontos do reino em que se produz a lã mais fina e apreciada, os nobres, os ricos, e mesmo certos reverendos padres, santos homens, sem dúvida, não só se não contentam com os rendimentos anuais que, desde os seus antepassados, sugam das suas terras, insatisfeitos com a sua vida ociosa e cheia de prazeres, que em nada aproveita ao bem comum, como roubam todo o espaço arável, para o converter em pastagens,





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