Procurar livros:
    Procurar
Procurar livro na nossa biblioteca
 
 
Procurar autor
   
Procura por autor
 
marcador
  • Sem marcador definido
Marcador
 
 
 

Capítulo 10: Capítulo 10

Página 116
do portão!

E a mísera, sem opor uma palavra, assistia ao despejo acocorada na rua, com os joelhos juntos, as mãos cruzadas sobre as canelas, resmungando. Transeuntes paravam a olhá-la. Formava-se já um grupo de curiosos. Mas ninguém entendia o que ela rosnava; era um rabujar confuso, interminável, acompanhado de um único gesto de cabeça, triste e automático. Ali perto, o colchão velho, já roto e destripado, os móveis desconjuntados e sem verniz, as trouxas de molambos úteis, as louças ordinárias e sujas do uso, tinham, tudo amontoado e sem ordem, um ar indecoroso de interior de quarto de dormir, devassado em flagrante intimidade. E veio o homem dos cinco instrumentos, que, aos domingos, aparecia sempre; e fez-se o entra-e-sai dos mercadores; e lavadeiras ganharam a rua em trajos de passeio, e os tabuleiros de roupa engomada, que saiam, cruzaram-se com os sacos de roupa suja, que entravam; e Marciana não se movia do seu lugar, monologando. João Romão percorreu o número 12, escancarando as portas, a dar arres e empurrando para fora, com o pé, algum trapo ou algum frasco vazio que lá ficara abandonado; e a enxotada, indiferente a tudo, continuava a sussurrar funebremente. Já não chorava, mas os olhos tinha-os ainda relentados na sua muda fixidez. Algumas mulheres da estalagem iam ter com ela de vez em quando, agora de novo compungidas, e faziam-lhe oferecimentos, Marciana não respondia. Quiseram obrigá-la a comer; não houve meio. A desgraçada não prestava atenção a coisa alguma, parecia não dar pela presença de ninguém. Chamaram-na pelo nome repetidas vezes; ela persistia no seu ininteligível monólogo, sem tirar a vista de um ponto.

— Cruzes! parece que lhe deu alguma!

— A Augusta chegara-se também.

— Teria ensandecido?... perguntou à Rita, que, a seu lado, olhava para a infeliz, com um prato de comida na mão. Coitada!

— Tia Marciana! dizia a mulata. Não fique assim!! Levante-se! Meta os seus trens pra dentro! Vá lá pra casa até encontrar arrumação!...

Nada! O monólogo continuava.

<< Página Anterior

pág. 116 (Capítulo 10)

Página Seguinte >>

Capa do livro O Cortiço
Páginas: 239
Página atual: 116

 
   
 
   
Os capítulos deste livro:
Capítulo 1 1
Capítulo 2 16
Capítulo 3 27
Capítulo 4 39
Capítulo 5 47
Capítulo 6 53
Capítulo 7 61
Capítulo 8 76
Capítulo 9 89
Capítulo 11 126
Capítulo 12 138
Capítulo 13 147
Capítulo 14 156
Capítulo 15 165
Capítulo 16 175
Capítulo 17 186
Capítulo 18 190
Capítulo 19 196
Capítulo 20 208
Capítulo 21 216
Capítulo 22 227
Capítulo 23 234