fechar a porta, ficar com ela aqui dentro da venda!
O soldado saiu e, daí a coisa de uma hora, Marciana era carregada para o xadrez, sem o menor protesto e sem interromper o seu monólogo de demente. Os cacaréus foram recolhidos ao depósito público por ordem do inspetor do quarteirão. E a Bruxa era a única que parecia deveras impressionada com tudo aquilo.
Entretanto, a chuva cessou completamente, o sol reapareceu, como para despedir-se: andorinhas esgaivotaram no ar; e o cortiço palpitou inteiro na trêfega alegria do domingo. Nas salas do barão a festa engrossava, cada vez mais estrepitosa; de vez em quando vinha de lá uma taça quebrar-se no pátio da estalagem, levantando protestos e surriadas.
A noite chegou muito bonita, com um belo luar de lua cheia, que começou ainda com o crepúsculo; e o samba rompeu mais forte e mais cedo que de costume, incitado pela grande animação que havia em casa do Miranda.
Foi um forrobodó valente. A Rita Baiana essa noite estava de veia para a coisa; estava inspirada; divina! Nunca dançara com tanta graça e tamanha lubricidade!
Também cantou. E cada verso que vinha da sua boca de mulata era um arrulhar choroso de pomba no cio. E o Firmo, bêbedo de volúpia, enroscava-se todo ao violão; e o violão e ele gemiam com o mesmo gosto, grunhindo, ganindo, miando, com todas as vozes de bichos sensuais, num desespero de luxúria que penetrava até ao tutano com línguas finíssimas de cobra.
Jerônimo não pôde conter-se: no momento em que a baiana, ofegante de cansaço, caiu exausta, assentando-se ao lado dele, o português segredou-lhe com a voz estrangulada de paixão:
— Meu bem! se você quiser estar comigo, dou uma perna ao demo!
O mulato não ouviu, mas notou o cochicho e ficou, de má cara, a rondar disfarçadamente o rival.
O canto e a dança continuavam todavia, sem afrouxar. Entrou a das Dores. Nenen, mais uma amiga sua, que fora passar o dia com ela, rodavam de mãos nas cadeiras, rebolando em meio de uma volta de palmas cadenciadas, no acompanhamento do ritmo requebrado da musica.