for, são gente arranjada... Isso não se lhes pode negar!
— Se são bons ou maus só com o tempo se saberá!... arriscou Dona Isabel.
— Quem vê cara não vê corações... sentenciou o triste Albino, suspirando.
— Mas o número 35 não estava ocupado por aquele homem muito amarelo que fazia charutos?... inquiriu Augusta.
— Estava, confirmou a mulher do ferreiro, a Leocádia, porém creio que arribou, devendo não sei quanto, e o João Romão então esvaziou-lhe ontem a casa e tomou conta do que era dele.
— É! acudiu a Machona; ontem, pelo cair das duas da tarde, o Romão andava aí às voltas com os cacarecos do charuteiro. Quem sabe, se o pobre homem não levou a breca, como sucedeu àquele outro que trabalhava de ourives?
— Não! Este creio que está vivo...
— O que lhe digo é que aquele número 35 tem mau agouro! Eu cá por mim não o queria nem de graça! Foi lá que morreu a Maricas do Farjão!
Três horas depois, Jerônimo e Piedade achavam-se instalados e dispunham-se a comer o almoço, que a mulher preparara o melhor e o mais depressa que pôde. Ele contava aviar até a noite uma infinidade de coisas, para poder começar a trabalhar logo no dia seguinte.
Era tão metódico e tão bom como trabalhador quanto o era como homem.
Jerônimo viera da terra, com a mulher e uma filhinha ainda pequena, tentar a vida no Brasil, na qualidade de colono de um fazendeiro, em cuja fazenda mourejou durante dois anos, sem nunca levantar a cabeça, e de onde afinal se retirou de mãos vazias e uma grande birra pela lavoura brasileira. Para continuar a servir na roça tinha que sujeitar-se a emparelhar com os negros escravos e viver com eles no mesmo meio degradante, encurralado como uma besta, sem aspirações, nem futuro, trabalhando eternamente para outro.
Não quis. Resolveu abandonar de vez semelhante estupor de vida e atirar-se para a Corte, onde, diziam-lhe patrícios, todo o homem bem disposto encontrava furo. E, com efeito, mal chegou, devorado de necessidades e privações, meteu-se a quebrar pedra em uma pedreira, mediante um miserável salário.