– Ah! Vou-me lembrando... Esse suicídio é que eu punha em dúvida nas minhas cartas que não recebeste.
– Porquê? Então mataram-na?!
– Já não vive há muitos anos o cirurgião que a tratou; eu saí daqui há trinta e cinco e nunca mais o vi; se ele vivesse, poderia ajudar-me a recordar. Espera lá... Como a velhice nos varre tudo da memória! Ah! Uma circunstância... o aparecimento de uma criança no rio...
– O quê?
– Espera, António, não me quebres o fio das recordações. Gonçalves Penha tapou a cara com as mãos, curvou-se bamboando a cabeça, ergueu-a com ímpeto, e disse:
– Parece que vejo reviver o passado... Olha, Queirós, na mesma noite em que essa rapariga apareceu moribunda no rio, um homem que andava à pesca encontrou uma criança viva num berço levado à tona da água. Falando eu a este respeito com o cirurgião, me disse ele que a Josefa talvez não se suicidasse; mas que morresse quando ia a fugir com a criança para tua casa.
– Não pode ser – atalhou António de Queirós.
– Porque não pode ser?
– Era cedo para ter já nascido o filho.
– Isso mesmo disse eu ao cirurgião, contando-lhe o que sabia da tua carta escrita do Limoeiro, porque tu, se bem me lembro, dizias- me que...