Maria Moisés - Cap. 3: Capítulo 3 Pág. 83 / 86

– Pode-se dizer que nasci aqui, ou pelo menos aqui vi a luz e o amor de uma madrinha que me criou e me deixou esta propriedade por esmola, porque eu nada tinha... Fui enjeitada, e tenho querido dar aos infelizes que não têm mãe nem pai o bem que recebi dos meus benfeitores. Infelizmente os recursos não me chegaram. Empenhei a quinta, e agora sou obrigada a vendê-la porque os juros são grandes e mais tarde ou mais cedo as confrarias hão-de tomar conta disto tudo. Vendendo eu a quinta por 10 000 cruzados, pago cinco e tanto que devo, e poderei com o restante amparar alguns anos mais estes pobrezinhos. Neste instante, entrou um rancho de treze meninos e meninas. Os rapazes vestiam uniforme de cotim escuro, e as meninas de riscadinho azul. O mais velho tinha onze anos, e era aleijado, encostava-se às muletas, e entrara muito contente, saltando na única perna, com uma alegria de idiota. Cumprimentou os circunstantes com desempeno de grande sociedade, e retirou-se às recuadas para a frente do grupo.

– Este aleijadinho é o que ensina os outros a ler; tem muita habilidade, e ajuda-me muito – disse Maria, e acrescentou: – Eu vou agora buscar os títulos.

– Não é urgente, minha senhora. Os títulos depois – disse o general. – O senhor tabelião lavra a escritura, enquanto eu vou dar uma vista de olhos por estas janelas – e encostando-se ao desembargador, segredou-lhe: – Preciso de ar.

– Senhor general – disse Maria Moisés.

– Minha senhora. – Se V. Ex.a há-de ter caseiro nesta quinta, peço-lhe que conserve aquele velhinho, que tem muitos filhos e netos.

– Sim, minha senhora – respondeu ele com a voz tremente das lágrimas.





Os capítulos deste livro