Abanou a cabeça, ficou calado e passámos uma tarde muito melancólica, mas jantámos juntos e dormimos juntos aquela noite e, quase no fim do jantar, mostrou-se um pouco mais alegre e pediu uma garrafa de vinho.
- Vamos, minha querida, embora a situação seja má, não ganhamos nada em estar tristes. Tranquiliza-te o melhor que puderes, pois arranjarei maneira de viver e, se puderes manter-te a ti mesma, já será melhor que nada. Tentarei de novo a minha sorte; um homem deve pensar como um homem e perder a coragem é capitular perante o infortúnio. - Encheu um copo e bebeu à minha saúde, segurando a minha mão e apertando-a com força enquanto bebi e afirmando-me, depois, que se preocupava sobretudo por mim.
Possuía, deveras, um espírito sincero e valoroso, o que tornava maior ainda a minha mágoa. Causa um certo alívio saber que fomos arruinadas por um homem de honra e não por um salafrário e, neste caso, a maior decepção sofrera-a ele, pois gastara um ror de dinheiro, iludido pela alcoviteira, apesar da sua grande pobreza. Note-se, antes de mais nada, a vileza da mulher, a qual, para ganhar cem libras, consentiu que ele gastasse mais trezentas ou quatrocentas, embora isso fosse, talvez, tudo quanto tinha no mundo (ou mais ainda, quem sabe?), baseada somente numa mexeriquice de mesa de chá, segundo a, qual eu possuía propriedades, fortuna ou coisa parecida. É verdade que o intuito de ludibriar uma mulher rica, se eu o fosse, era vil e que a pretensão de grandeza, sendo a sua situação de pobreza, só pode ser considerada burla, e grave; mas o caso era, de certo modo, diferente e de uma maneira que abonava a seu favor. Não se tratava de um libertino que vivesse de iludir mulheres e de, como alguns têm feito, apanhar seis ou sete fortunas, uma após outra, e, depois, adeus, passem muito bem; mas, sim, de um verdadeiro fidalgo, desafortunado e pobre, apesar de já ter vivido bem.
