Se eu tivesse agido como devia e resistido como a virtude e a honra mandam, este cavalheiro teria desistido dos seus ataques, por não ter esperanças de realizar os seus desígnios, ou feito leais e honrosas propostas de casamento, caso em que, por muito que o censurassem a ele, não podiam censurar-me a mim. Em resumo, se ele me conhecesse e soubesse como seria fácil obter a ninharia que cobiçava, não teria dado mais voltas à cabeça e, por quatro ou cinco guinéus, ter-se-ia deitado comigo na primeira oportunidade. E eu, se adivinhasse os seus pensamentos e soubesse como me julgava difícil de conquistar, ter-lhe-ia apresentado as minhas próprias condições e, se não capitulasse por um casamento imediato, podia, pelo menos, exigir-lhe uma pensão até ao casamento e pedir o que quisesse, pois ele era já riquíssimo, sem contar com o que esperava ainda herdar. Mas eu parecia ter esquecido por completo tais pensamentos e andava cega de vaidade por ser tão bela e amada por tal cavalheiro. Quanto ao ouro que me dava, passava horas a olhá-lo e contava os guinéus milhares de vezes por dia. Jamais houve criatura mais ofuscada pela vaidade do que eu, incapaz de reflectir no que me esperava e em quão perto da minha porta estava a desgraça; creio até que, em vez de pensar numa maneira de evitar essa desgraça, a desejava.
Entretanto, porém, era suficientemente astuta para não dar a ninguém da família motivos para suspeitar de mim ou para imaginar que tinha qualquer entendimento com o moço cavalheiro; quase nunca olhava para ele em público ou lhe respondia se me falava quando alguém estava perto de nós. Apesar disso, tínhamos de vez em quando um pequeno encontro que nos permitia trocar uma ou duas palavras, e até um beijo, embora faltasse oportunidade para a má acção premeditada, tanto mais que ele se dava a rodeios que, se conhecesse os meus pensamentos, evitaria, pois, julgando a tarefa difícil, dificultava-a desnecessariamente.
