A moral de toda a minha história deve ser apreendida pelos sentidos e pelo discernimento do leitor, pois não tenho competência para lhe pregar sermões. Que a experiência de uma criatura totalmente perversa e desgraçada seja um manancial de advertências úteis para os que lerem estas aventuras.
Aproximo-me agora de uma nova variedade de cenas da vida. Após o meu regresso, endurecida por uma longa série de pecados e com um êxito inigualável, pelo menos que soubesse, não tinha, repito, a mínima ideia de abandonar um tráfico que, a julgar por tantos exemplos que tivera, acabaria em miséria e sofrimento.
No Natal seguinte, à tarde, para coroar uma longa sucessão de delitos, saí a ver se surgia qualquer coisa que valesse a pena. Ao passar pela oficina de um prateiro, em Foster Lane, vi uma isca tentadora e irresistível para quem se dedicasse ao que me dedicava, pois, além de não se encontrar ninguém na oficina, viam-se vários objectos de prata espalhados na montra e no lugar onde me pareceu que o artífice costumava trabalhar.
Entrei atrevidamente e preparava-me para deitar a mão a uma peça de prata - e tê-lo-ia feito com êxito e sem dificuldade, por via da negligência de quem trabalhava na oficina -, quando um intrometido de uma casa em frente, que me vira entrar e notara que não se encontrava ninguém no estabelecimento, atravessou a rua a correr, entrou pela porta dentro como um pé-de-vento e, sem mais aquelas, me agarrou e gritou pelos da casa.
Felizmente não tocara ainda em nada e, ao vislumbrar que alguém corria para a oficina, tive a presença de espírito necessária para bater com o pé no chão, com força, e começar a chamar por gente quando o indivíduo me deitou a mão.
No entanto, como me sinto sempre com mais coragem nos momentos de maior perigo, mostrei-me arrogante e declarei que estava ali para comprar meia dúzia de colheres de prata.
