Nessas caixas iam também a minha prata, os meus relógios e tudo quanto possuía além do dinheiro, que levava, como já disse, numa gaveta secreta da arca, gaveta que não podia ser encontrada nem aberta, se encontrada, sem partir a arca toda.
Permaneci três semanas no barco, sem saber se o meu marido me acompanharia ou não e sem me poder resolver, portanto, a aceitar a proposta do contramestre, o qual, ao princípio, achou um pouco estranha a minha hesitação.
Findo esse tempo, porém, o meu marido foi levado para bordo. Chegou com um aspecto desanimado e furioso e com o grande coração dilatado de cólera e desprezo. Era duro ser acompanhado por três carcereiros de Newgate e posto a bordo como um condenado, ele que não fora, sequer, julgado. Queixou-se do facto aos amigos, pois parece que os tinha poderosos, mas as súplicas destes foram rejeitadas, com a alegação de que o meu marido fora já demasiado favorecido e que haviam recebido tais informações a seu respeito, depois da concessão do degredo, que devia considerar-se muito feliz por não ser novamente preso. Esta resposta calou-o imediatamente, pois de mais sabia ele o que podia acontecer e o que tinha motivos para esperar. Compreendeu então a excelência dos conselhos que recebera para aceitar a oferta de degredo voluntário, o desgosto que sentia pelo tratamento sofrido acalmou-se um pouco, mostrou-se mais resignado, mais alegre, e, quando lhe disse quanto me sentia feliz por o saber fora das mãos da justiça, abraçou-me e afirmou, com grande ternura, ter recebido de mim os melhores conselhos.
- Salvaste-me duas vezes a vida, minha querida, e a partir de agora empregá-la-ei sempre em teu serviço e aceitarei todos os teus conselhos.
O barco começou, finalmente, a encher-se, vieram para bordo alguns passageiros que não tinham quaisquer contas a prestar à justiça e aos quais estavam reservadas acomodações na grande cabina e noutras partes do navio, enquanto nós, condenados, teríamos de viajar sobre o convés, não sei onde.
