Pois tinha esperança de que, quando fossem já por sobre as ondas, cruzando os mares com a Inglaterra finalmente para trás, aquela Inglaterra que ele tanto odiava, talvez porque, de certa forma, esta parecia tê-lo envenenado, ter-lhe espetado o seu ferrão, ela acabaria finalmente por adormecer, fechara finalmente os olhos, dando-se-lhe sem reservas.
E então ela seria finalmente sua e ele poderia, por fim, viver a sua própria vida, a vida por que tanto ansiava. Agora sentia-se irritado e aborrecido, sabendo que ainda não alcançara essa vida que desejava viver. E nunca a alcançaria enquanto ela não se rendesse, enquanto ela não adormecesse de vez, entregando-se-lhe, dissolvendo-se nele. Então sim, então ele já poderia viver a sua própria vida enquanto homem e enquanto macho, tal como ela já poderia viver a dela enquanto mulher e enquanto fêmea. E deixaria para sempre de haver esta medonha tensão, este esforço tenaz, obstinado, insano. Ela nunca mais voltaria a parecer um homem, a querer ser uma mulher independente com responsabilidades de homem. Não, nunca mais, pois até mesmo a responsabilidade pela sua própria alma ela teria de lhe confiar, de entregar nas suas mãos. Ele sabia que tinha de ser assim, por isso lhe fazia obstinadamente frente, esperando a sua rendição.
- Sentir-te-ás melhor uma vez que tenhamos partido, cruzando os mares em direcção ao Canadá, lá diante - disse-lhe ele quando se sentaram nas rochas por sobre o penhasco.
Ela olhou então para o horizonte, lá onde o céu e o mar se confundiam, como se este não fosse real. Depois, voltando-se para ele, olhou-o com aquela estranha expressão de esforço de uma criança em luta contra o sono.
- Achas que sim? - perguntou.
- Sim, acho que sim - respondeu ele calmamente.